terça-feira, 21 de junho de 2011

A revelia e seus efeitos


 
De forma bem simples, direta e objetiva, a revelia é a situação do réu validamente citado que não se defende no prazo legal. A defesa pode consistir de contestação, exceção ou reconvenção (Art. 297, CPC).

O prazo é geralmente de 15 dias, exceto quando se tratar da Fazenda Pública e do Ministério Público, quando o prazo será de 60 dias (art. 188 CPC) e na hipótese de litisconsórcio passivo, caso cada parte tenha um advogado diferente, quando o prazo será de 30 dias (Art. 191, CPC), devendo ser contado a partir da juntada aos autos do último aviso de recebimento ou mandado citatório cumprido (Art. 241, III, CPC).

Na contestação cabe ao réu argüir preliminares, alegar toda matéria de defesa e requerer as provas que pretende produzir. Deve ainda manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial. Os fatos narrados na inicial e não contestados pelo réu são presumidos como verdadeiros, salvo as exceções previstas em lei (Art. 302, CPC).

Sob a ótica dos preceitos acima, gostaria de destacar dois pontos que são comuns no dia-a-dia do advogado, quais sejam: o início da contagem do prazo e a contestação parcial.



1. Início da Contagem do Prazo

Trata-se de questão aparentemente fácil, pois, a princípio, o prazo para defesa conta-se a partir do dia seguinte ao da juntada do aviso de recebimento ou do mandado cumprido pelo Oficial de Justiça.

Mas, e se o processo não estiver no cartório judicial? Quando o AR é devolvido pelos Correios ou o Mandado de Citação é trazido ao cartório judicial pelo Oficial de Justiça, o escrevente certifica nos autos a data em que procedeu a juntada, a qual é considerada para fins de contagem de prazo para contestar.

Antes da citação, presume-se que o processo está no cartório. Entretanto, há casos em que, sabendo do processo, o advogado do réu se adianta, juntando a procuração aos autos e retirando-os do cartório antes da juntada do mandado citatório cumprido.

Aparentemente, este expediente poderia ampliar o prazo para contestar, tendo em vista que os autos não estão no cartório e não poderão receber o AR ou o mandado cumprido, o que seria o termo inicial da contagem de prazo para a contestação.

Sob esta ótica, se o advogado do réu permanecesse com os autos durante 60 dias, o prazo correria somente após a devolução dos autos e conseqüente juntada do mandado cumprido.

Ocorre que o Art. 241 do Código de Processo Civil não deve ser aplicado de forma absoluta. Esse é o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça e vem sendo aplicado por juízes de primeira instancia e tribunais estaduais:

PROCESSUAL CIVIL. CITAÇÃO. PRAZO PARA CONTESTAÇÃO. RETIRADA DOS AUTOS DO CARTÓRIO ANTES DA JUNTADA AOS AUTOS DO MANDADO DE CITAÇÃO. CIÊNCIA INEQUÍVOCA. CONTAGEM DO PRAZO. 
1. A retirada dos autos de cartório pela parte ré, evidencia ciência inequívoca da ação a ser contestada, revelando-se irrelevante a formalização da providência processual prevista no art. 241, II, do CPC para fins de início do prazo para defesa, qual seja, a juntada aos autos do mandado de citação. 
Precedentes: (Segunda Turma, REsp nº 235.823/CE, relator João Otávio de Noronha, DJ de 01/07/2005); (Terceira Turma, REsp nº 254.553/MG, relator Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, DJ de 12/5/2003); (Resp 88.509/SP, Rel. Ministro COSTA LEITE, DJU, 05/08/1996).
2. A regra do art. 241 do Código Adjetivo Civil que estabelece o prazo para contestar inicia-se da juntada aos autos do mandado cumprido, devendo ser interpretada “cum granu salis”, porquanto há hipóteses em que a contagem do prazo pode iniciar-se antes do ato processual descrito na norma. 

3. A regra geral do artigo 241 do CPC não exclui, mas ao revés, convive, com outras hipóteses especiais em que se considera efetivada a intimação. Nesse sentido, enquadra-se a teoria de 'ciência inequívoca'. Assim, inicia-se o prazo da ciência inequívoca que o advogado tenha do ato, decisão ou sentença, como, v.g., a retirada dos autos do cartório, o pedido de restituição do prazo, etc". (FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil, 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004). 
4. Consectariamente, retirado os autos do cartório pelo patrono do recorrente após sua citação, mantendo o processo em seu poder por aproximadamente 10 (dez) dias, torna-se inequívoca a ciência do ato pelo advogado, iniciando-se, a partir daí, o termo para resposta. 
5. Recurso especial improvido. (STJ, REsp 698.073/SE, 1ª Turma, Rel. Min. LUIZ FUX, DJU 28/11/2005, p. 210), grifos nossos.

Desta forma, não é apenas a juntada do AR ou do mandado cumprido aos autos que faz iniciar-se a contagem do prazo para defesa, mas também a ciência inequívoca da existência do processo, consubstanciada na retirada dos autos por parte do advogado do réu.


2. Contestação Parcial

Em pouco tempo de experiência na advocacia temos visto uma série de peças de contestação que são verdadeiros “tratados” teóricos sobre o tema em debate, mas que, contudo, não atacam os fatos narrados na inicial.

O Art. 302, inciso III do CPC afasta a presunção de veracidade dos fatos não impugnados, mas contrários à defesa considerada em seu conjunto. O que se observa, todavia, são contestações extremamente abstratas, que deixam margem para a declaração de revelia por parte do juiz, induzindo o impedimento do réu produzir provas e o julgamento antecipado do processo.

Muitos advogados, no afã de demonstrar conhecimento (ou na pressa para cumprir prazos) excedem-se nas citações doutrinarias e jurisprudenciais, afastando-se dos fatos. Outros simplesmente copiam e colam vários trechos de textos desconexos, totalmente alheios aos fatos narrados na inicial, e protocolam tais peças, crentes de que estão contestando a ação.

O Poder Judiciário tem reconhecido a revelia em inúmeros casos em que o réu pensa ter contestado a ação. De fato, foi apresentada a defesa, mas ela nada disse sobre os fatos narrados na inicial e, portanto, os mesmos são presumidos como verdadeiros pelo magistrado.


3. Efeitos da Revelia


A revelia tem efeitos nefastos sobre a atuação processual do réu. Dentre eles, podemos citar a perempção do direito de produzir provas, o transcurso dos prazos independentemente de intimação (caso em que não tiver advogado nos autos) e, principalmente, o julgamento antecipado da lide.
O Poder Judiciário entende que não há necessidade de produção de provas, amparado na doutrina:

Ainda que a jurisprudência do CPC/39 admitisse a produção de provas pelo réu revel (STF 231), no sistema atual isto não é permitido. O CPC 334 III e IV vedam a produção de prova sobre fatos incontrovertidos no processo ou a respeito dos quais pesa presunção legal de veracidade. Não contestando, o réu revel deixou de controverter os fatos afirmados pelo autor, fazendo com que sobre eles pesasse a presunção de veracidade do CPC 319. Assim, esses fatos são insuscetíveis de prova. O juiz, na audiência preliminar, não tem como fixar os pontos controvertidos sobre os quais versará a prova, porque não há controvérsia (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. Editora RT. 11ª. Ed., p. 622).


Por derradeiro, cumpre-nos destacar que a revelia não induz a procedência da ação do autor, caso em que o magistrado deverá agir com prudente arbítrio ao julgar a causa. Pode acontecer de determinados fatos dependerem da produção de provas, o que será decidido pelo juiz. Haverá casos em que as partes pedirão um valor (geralmente nas indenizações) que não será aceito pelo juiz, que poderá arbitrar um valor diferente.

De qualquer modo, a revelia tem efeitos negativos sobre o réu, devendo a mesma ser evitada a todo custo pela parte e por seus patronos.